Este era o
motivo, segundo depoimento do antigo pároco da Penha, Padre António Benedito de
Camargo, de a então Freguesia da Penha de França, ser freqüentemente procurada
por tantas pessoas adoecidas, que aqui vinham em busca de bons ares que a
curassem de suas enfermidades. Ventos capazes de promover, tanto a saúde do
corpo como a saúde do espírito.
Bafejados por
tais ventos, os negros que nas imediações viviam, constituídos como membros de
uma irmandade, no ano de 1802, solicitaram do bispo autorização para
construírem uma igreja, dedicada a Nossa Senhora do Rosário, um lugar onde
pudessem praticar suas devoções, além de enterrar dignamente seus mortos, o que
os faria se sentirem um pouco menos segregados pela comunidade.
Voltando no
tempo, aos primórdios do cristianismo, percebemos que este, nos seus três
primeiros séculos de existência, sofreu grandes perseguições da parte dos
imperadores romanos. Na arena do Coliseu, os mesmos ofereciam ao povo pão e
circo, espetáculos de atrocidades nos quais milhares de cristãos eram jogados
para serem devorados por tigres e leões. Depois veio o período, inaugurado pelo
Imperador Constantino, em que o cristianismo passou a ser religião oficial do
Império Romano. A Igreja Católica se desenvolveu e se expandiu em todas as
direções e até aos extremos mais longínquos. Com a descoberta da bússola e o
aprimoramento das embarcações vieram os grandes descobrimentos e a ampliação
dos comércios. A invenção da imprensa, o protestantismo, e a disseminação das
idéias liberais fizeram com que a sociedade fosse se tornando cada vez mais
ciosa de seus direitos de liberdade de expressão religiosa. Mais tarde,
Garibaldi promoveu a unificação da Itália e a Igreja perdeu os Estados
Pontifícios. O Papa convocou o Concílio Vaticano I para poder tomar pé da
situação e garantir à Igreja os meios de manter-se em condições de garantir-se
em sua sustentabilidade. A instituição das Irmandades dava aos leigos poder
sobre as igrejas por elas construídas e administradas. Associações religiosas “modernas”
surgiram, estruturadas de maneira a servirem melhor aos objetivos de
centralizar o poder nas mãos do clero.
No Brasil, o
número de padres seculares era pequeno. Poucos eram também os sacerdotes
religiosos, uma vez que, tanto em Portugal como no Brasil, o número destes
havia diminuído muito por conta das proibições impostas por Pombal. Nesse
contexto, vieram da Holanda e da Alemanha missionários redentoristas para
assumirem a evangelização em vários estados brasileiros. O objetivo deles era,
também, de retirar o poder que as irmandades tinham sobre as igrejas por elas
construídas e administradas.
Trazidos por
esses ventos, os redentoristas chegaram à Penha no ano de 1.905. O vigário Padre
Antonio Benedito já era bastante idoso. Foi ele que deu posse ao novo pároco.
Uma equipe de padres o auxiliava no atendimento da paróquia, que naquela época
se estendia até Mogi das Cruzes. Iniciaram suas obras com fervor missionário.
Logo os frutos de todo esse empenho começaram a aparecer. Em 20 de Julho de
Quando chegou o ano de 1934 e foi iniciada a reforma do Santuário, os padres redentoristas precisavam reorganizar o uso da Igreja do Rosário. A paróquia já possuía várias associações religiosas para leigos. Não sabemos como a Irmandade dos Homens Pretos se encontrava naqueles tempos. O fato é que, a pedido do vigário na época, Padre Oscar Chagas Azeredo, que era um dos primeiros redentoristas brasileiro, foi feita solicitação ao arcebispo metropolitano Dom Duarte Leopoldo e Silva para que autorizasse a fundação e ereção canônica da Irmandade de São Benedito em forma de Associação, de acordo com os estatutos que deviam ser por ele aprovados.
Uma leitura um
pouco mais atenta desses estatutos revela a forma ardilosa como foram tratados
os membros da Antiga Irmandade dos Homens Pretos da Penha de França. O primeiro
ponto a observar é o fato de a Associação ter sido instalada na Matriz de Nossa
Senhora da Penha e não na Igreja do Rosário. Com isso, foi ignorado de que os
negros já tinham essa Igreja e não precisavam de outra. O Regulamento não leva
em consideração a importância de Nossa Senhora do Rosário e de sua história
junto aos negros, desde os tempos em que se encontravam na África. Mais adiante, o texto dá a entender que uma
Igreja dedicada a São Benedito seria construída para a nova Irmandade-Associação,
coisa que nunca veio a acontecer até os dias de hoje. “Enquanto não se construir a
igreja de São Benedito, a sede da Associação será a Igreja do Rosário, nas
horas não tomadas por outras associações de combinação com o Vigário” (pág.
5). Essa afirmação mostra que a Igreja de Nossa Senhora do Rosário já não era
mais considerada como pertencente à Irmandade dos Negros. O Estatuto autoriza
apenas que seja feita anualmente uma festa em honra de São Benedito. Mais uma
vez, Nossa Senhora do Rosário é deixada à parte. No Cap. 4º, que trata dos
Direitos dos Associados. o Art. 17 diz: “Todo associado falecido tem o direito a
três missas que, por conta da Associação, serão mandadas celebrar para sufragar
a sua alma. Essas missas serão de 7º. Dia, mês e ano”. Porém, no
versículo 2º. Vem a ressalva: “Enquanto o estado financeiro da Associação
não for desafogado, o associado só tem direito a uma missa após o falecimento”.
Os ventos vêm e
vão. A Irmandade de São Benedito teve seu espaço durante trinta/quarenta anos.
Nunca pode gozar de todo prestígio que merecia. A Igreja sempre se manteve na
condição de Capela, subordinada à Matriz de Nossa Senhora da Penha. Se as
festas em honra do padroeiro conseguiam seu espaço de realização era por conta
de algumas pessoas que, com grande devoção, as organizava anualmente. Em
A chama acesa
foi atingida por novos ventos. A impressão que se deu foi de que ela tinha sido
totalmente apagada. Mas, não foi o que exatamente acontecera. O futuro
reservava a chegada de ventos mais promissores do nunca. O elo quebrado
voltaria a se reconstituir.
Postado por José Morelli
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