domingo, 16 de agosto de 2020

De dentro da própria pele

É a partir de seu avesso que todos nós nos desenvolvemos, juntamente com os demais órgãos que ocupam o interior de nosso corpo, sejam eles relacionados às suas funções motoras, sensitivas, sexuais, respiratórias, digestivas, cerebrais e outras. É a partir da demarcação que nossa própria pele nos proporciona que nos percebemos e nos reconhecemos em nossos limites externos: onde começamos e onde terminamos, onde alcançamos e onde não conseguimos alcançar. Constituímo-nos materialmente e é sobre esta nossa base física que nos aperfeiçoamos em nossas capacidades intelectuais: físicas, mentais/emocionais e espirituais.

Existimos e nos movimentamos no tempo e no espaço, conscientes de que somos e acontecemos na sucessão das gerações. Vivemos nosso momento presente histórico, compartilhando nossa existência com nossos contemporâneos e conterrâneos de perto e de longe. Reconhecemo-nos em nossa própria individualidade e somos capazes de reconhecer o outro na identidade física e psicológica (individuada) que lhe é própria.

A pisada recebida no meu pé e que me machuca é sentida por mim – de dentro da própria pele, e menos por aquele que o pisou. Não há como negar que, neste caso, a dor é minha e não dele e é ele que deve pedir desculpas e retratar-se e não eu. Na sociedade em seu todo sempre há aqueles que ferem com suas atitudes e posturas e há aqueles que são feridos. Assim como acontece no plano da individualidade, assim também acontece no plano da coletividade: os que estão habituados a ferir sentem menos dor e mágoa do que aqueles que estão sendo feridos.

Uma percepção mais ampla da realidade exige que não nos ignoremos no que somos e no que necessitamos, individualmente e/ou coletivamente.  Nossa capacidade amadurecida deve nos permitir que nos sensibilizemos com as diferenças, buscando mais equidade nas relações humanas, no que concerne aos direitos e às obrigações que competem a nós todos, indistintamente.

Postado por José Morelli 

terça-feira, 11 de agosto de 2020

Inferência histórica

O termo inferência é aplicado, especialmente, à lógica. Trata-se de uma dedução, de uma verdade concluída a partir de outras verdades (silogismo). A inferência histórica a que me refiro é a seguinte: Se é um fato incontestável que, em seus primeiros tempos, o nosso bairro da Penha de França, serviu como lugar de passagem e de pouso para viajantes e tropeiros, que iam ou vinham de diversas outras regiões do país, esse fato nos leva a concluir que, aqui, havia certa estrutura de acolhimento (estalagem, armazém e outros prestadores de serviços) não só para as pessoas como também para os animais que as acompanhavam. Documento, dos mais antigos, atesta que, ao lado da primitiva capela, havia um curral.

Desses fatos decorre, também, que os demais moradores da região da Penha, alguns donos de terras com seus familiares e serviçais (escravos negros ou indígenas), vez ou outra, costumavam chegar a esse centro, onde se davam as principais transações comerciais daquilo que produziam. Mesmo que o objetivo principal fosse a troca de mercadorias, outra troca também não podia deixar de se dar: a de informações.

Num tempo em que não havia nem rádio, nem televisão e, menos ainda, internet e a maior parte das pessoas não sabiam ler e escrever, o boca a boca era o principal meio de difusão das notícias e novidades (fofocas) que “pipocavam” em todos os cantos. O vai e vem de gente, pela Penha dos primeiros tempos, vinda de além mar e de outros recantos do Brasil: de São Vicente ou do Rio de Janeiro, do Vale do Paraíba, das Minas Gerais, da Bahia ou de Pernambuco, dos pampas gaúchos ou de outras vilas e capitanias.  Do poeta Paulo Eiró (1825-1871), que por aqui passou, a Penha mereceu um de seus mais singelos poemas, intitulado “Homenagem à Penha”. Dom Pedro I, acompanhado de sua comitiva, também pernoitou na Penha, em 24 de agosto de 1822. Nessa mesma viagem, no dia 7 de setembro, às margens do Riacho Ipiranga, Dom Pedro proclamou a Independência do Brasil.   

As festividades de nosso bairro, durante o mês de setembro que já está às portas, é uma oportunidade a mais de estreitarmos nossos laços com o lugar em que vivemos e com as pessoas, que conosco aqui compartilham e pisam neste mesmo chão. 

Postado por José Morelli