terça-feira, 30 de novembro de 2021

Anunciando a Boa Nova

Acontecimentos não se esvaem no tempo, como a água que escapa pelos vãos dos nossos dedos das mãos, sem possibilidade de retorno imediato. Os acontecimentos, em seus desdobramentos, geram outros e mais outros, numa sequência quase que infindável. Daí, que se pode entendê-los inseridos na infinitude do tempo e do espaço.

O Nascimento do Menino Jesus, em Belém da Judéia, foi pré-anunciado 700 anos antes, pelos profetas do Antigo Testamento. Miquéias destaca os seguintes detalhamentos do mesmo: “E tu Belém, pequena entre as cidades de Judá, é de ti que sairá para Mim Aquele que deve governar Israel e cujas origens remontam aos tempos de outrora, aos dias antigos (Miquéias 5,1).

Já o profeta Isaías assim o descreve: “E lá vem, a tua luz! E a glória de Javé desponta sobre ti... A esta vista serás radiosa, teu coração palpitará e se dilatará,... a ti chegarão as riquezas das nações. Uma inundação de camelos te cobrirá, dromedários de Madian e de Efa! Todos virão de Sabá, eles trarão ouro e incenso; e anunciarão os louvores de Javé”. (Isaías 60,1; 5e6).

A tradição do presépio faz emergir da história bíblica o acontecimento do Natal de Jesus. Como as demais igrejas católicas romanas, a do Rosário da Penha, também montou seu presépio. Fiel às suas origens históricas no bairro, pelo fato de ter sido construída pela Antiga Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos da Penha de França, os personagens José, Maria e o Menino Jesus, bem como as figuras dos reis magos: Gaspar, Melchior e Baltazar, são identificados com a mesma cor dos irmãos e irmãs da irmandade, idealizadora e construtora da igreja, ainda nos tempos em que vigia no Brasil o regime de escravidão. As roupas que vestem as imagens dão-lhes a dignidade que merecem e sempre mereceram, mesmo nos tempos em que eram submetidos e submetidas aos trabalhos mais pesados em todas as áreas.

Assim como a Estrela Guia, aparecendo no Oriente, anunciou aos reis magos o nascimento do Messias prometido aos judeus, a mensagem de Jesus chega hoje a todos e todas de boa vontade, aqui e nos recantos mais longínquos do mundo.

Fizeram parte da equipe de planejamento e execução do presépio do Rosário deste ano: a Natália (do Estúdio da Torre) a Selma, o Robinson, a Patrícia e a Rosângela. Venham visita-lo!

Postado por José Morelli

 

  

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Diversidade cultural

 Quanto mais aumenta nossa capacidade de comunicação, em rapidez e alcance, vamos expandindo nossos limites de conhecimentos de outras manifestações culturais, além daquelas junto às quais nascemos e nos desenvolvemos. Os caminhos percorridos pelas diversas culturas fizeram com que elas se constituíssem de maneiras diferenciadas. O desenvolvimento de toda essa multiplicidade cultural se deveu e se deve à necessidade humana de compartilhamento, mediante trocas recíprocas de suas produções no viver e no conviver.

Todas as formas de cultura possuem seus fundamentos, suas trajetórias próprias. As linguagens de cada uma delas foram construídas a partir dos estímulos provocados pelas condições ambientais. As peculiaridades da natureza condicionaram a formação das ideias, dos utensílios domésticos, das armas de defesa e de ataque, dos instrumentos musicais e de suas sonoridades, da poesia, da prosa, da dança e de outras expressões artísticas.

Acostumamo-nos e aprendemos a gostar daquilo que nos foi e é oferecido para que vejamos e ouçamos. Identificamo-nos com as formas culturais dos lugares que fazemos parte.  Nada, no entanto, nos deve proibir de abrir-nos a outros gostos que não seja o daquilo tudo que pertence à nossa cultura de origem. Subjacente às culturas de cada país ou região, existem sempre preciosos valores a serem considerados e respeitados.

A música é considerada uma linguagem universal, podendo ser mais facilmente entendida em suas mensagens. As sonoridades musicais, ao reverberarem em nossos tímpanos, sensibilizam nosso corpo e nossa mente. A alma de cada povo pode ser mais bem captada pela musicalidade produzida por sua cultura.

Num mundo economicamente globalizado, seria fundamental que as múltiplas culturas também fossem compartilhadas globalmente. Mesmo que tendo que dar fortes braçadas para vencer a correnteza, ainda assim seria importante que tivéssemos o coração e a mente abertos para aceitação de outros povos bem como de suas respectivas culturas.

Postado por José Morelli

 

Associações

 A um pensamento pode se associar um sentimento, ligando-se um ao outro como causa e efeito. De igual maneira, a uma sensação física pode se associar um pensamento que, por sua vez, pode promover um sentimento novo qualquer, de alegria ou de tristeza. Vivemos associando. Não é à toa que nosso corpo é considerado um organismo. Nele, tudo funciona concatenado em todas as direções, de um lado para o outro, nas diagonais, de cima para baixo ou no sentido contrário a este. Enquanto a vida junta e associa, a morte separa e dissocia. Muito antes de os nossos predecessores humanos construírem máquinas e aparelhos, que hoje nos parecem tão sofisticados em suas associações causais, já as suas mentes e corpos funcionavam mediante o princípio de associações constantes de pensamentos e de idéias, de sensações e de sentimentos, de partes do corpo associando-se umas com outras e de cada uma e de todas com o conjunto do todo e vice-versa. Num trabalho assim, cada órgão de nosso corpo realiza uma função específica, o mesmo acontecendo com o nosso ser inteiro, enquanto busca a consecução de seus objetivos.

Somos dinâmicos. Desenvolvemo-nos em muitas direções. Nem sabemos, precisamente, onde podemos chegar naquilo que nos propomos levar a termo. Nossas capacidades são múltiplas. Delas podemos escolher desenvolver mais a umas que a outras. Associamo-nos para competir individualmente ou em equipe. Competição é emulação, estímulo. Servimo-nos uns aos outros no esforço de superar-nos em nossos limites. Afastando-nos ou aproximando-nos podemos nos manter associados. Objetivos comuns nos servem como pontos de ligação, possibilitando-nos a utilização do melhor de nós mesmos, para alcançarmos aquilo que buscamos.

Estamos ainda sob o efeito das emoções da conquista do pentacampeonato, pela equipe brasileira de futebol, no último fim de semana. Das boas qualidades que os jogadores revelaram, o espírito de equipe parece ter sido fundamental para que eles conseguissem se sobressair aos outros, vencendo-os em todos os jogos que realizaram. O exemplo deles vem ao encontro de nossos anseios. Precisamos muito desse mesmo espírito de equipe. Nós e o Brasil precisamos muito dessa união, dessa associação, desse esforço comum, desse interesse, dessa harmonia, entre todos, dentro e fora do campo, não só de quatro em quatro anos, mas sempre, em todos os anos, meses, dias: em suas 24 horas... ininterruptamente.

Nota: esta matéria foi escrita e publicada no jornal do bairro “Gazeta Penhense”, em 2002, na semana seguinte à conquista do Pentacampeonato de futebol pelo Brasil.    

Postado por José Morelli 

segunda-feira, 18 de outubro de 2021

Gentileza

O dicionário etimológico diz que a palavra gentileza vem do vocábulo gentil. Do latim, gentilis tem o sentido de pertencente à mesma família ou ao mesmo clã. A gentileza nasce do sentimento de igualdade (familiaridade) entre as pessoas. Igualdade fundamental no que diz respeito à dignidade e aos direitos de cada um. Gentileza é a qualidade de quem é gentil, de quem é amável e respeitoso ao se dirigir ao próximo por palavras ou por ações concretas.

Atitudes de gentileza possuem uma força intrínseca. O tratamento amoroso e equânime da mãe para com sua prole serve-lhe como exemplo a ser aprendido e seguido, dentro e fora de casa. É dessa forma que se inicia o processo de educação a partir da relação íntima de cada família. Os filhos disputam o amor dos pais. O desejo de serem preferidos, mais a um que a outro, faz com que se criem disputas entre eles (meninos e/ou meninas). Essa disputa acaba distanciando os irmãos, salientando lhes mais as diferenças do que as semelhanças. A troca de gentileza, no acirramento dessa competitividade, é substituída por maus tratos e agressividade mútua entre pessoas que trazem nas veias um mesmo sangue.

Os modelos de relacionamentos perpassam a humanidade inteira desde os menores grupos até os maiores. Os exemplos positivos ou negativos acontecem em todos os níveis: nas relações entre povos e nações e nas que envolvem não mais do que apenas dois indivíduos. A competitividade estrutural do mercado mundial não esgota o sentido de sustentabilidade, necessária ao bom desenvolvimento da humanidade em sua total abrangência.

Multiplicar gestos de gentileza ajuda a sociedade a criar uma sinergia positiva contagiante. A ação gentil descreve um caminho de ida e de volta. Quem a pratica se constrói em sua dignidade enquanto reconhece a dignidade do outro. Quem recebe a gentileza é instado a reconhecer-se em sua própria importância e a de quem foi capaz de, efetivamente, demonstrá-la. 

Postado por José Morelli

  

domingo, 10 de outubro de 2021

Futebol-reflexão

 Mais do que em outros tempos, a volta dos campeonatos de futebol no pós-pandemia, enseja que alguma reflexão seja feita sobre os valores do mesmo; uma vez que são tantos os que a ele dedicam grande parte do próprio tempo e das próprias energias, no mundo inteiro.  O futebol, em verdade, é paradigmático. O que acontece com ele e nele acontece também nas outras atividades das pessoas, em geral.  Como toda brincadeira, o futebol nasceu espontaneamente. Pouco a pouco, foi criando regras que o tornou mais estimulante. As habilidades passaram a ser premiadas e a falta delas punidas.

Alguns tijolos ou pedras podiam servir como gol e meias velhas conseguiam cumprir um bom papel como bola. O acesso a essa atividade lúdica era fácil e democrático. Não era preciso muito espaço: um corredor suficiente para ultrapassagens, uma pequena área de serviço, o luxo de um campinho em algum terreno baldio próximo já era suficiente para atrair garotos sedentos de se divertirem. O nosso craque do passado, Julinho Botelho, que tanto gostava da Penha, iniciou-se como jogador nos campinhos de várzea, que ladeavam a linha férrea da Central do Brasil, lugar conhecido pelo nome de Hortolândia. Ali havia chácaras de flores de propriedade de famílias de imigrantes europeus. A saudade que sentia de seus tempos de infância, no bairro, fez com que se recusasse a assinar contrato milionário no futebol italiano, preferindo voltar à sua terra natal.

O futebol se adaptou aos brasileiros e os brasileiros se adaptaram ao futebol. Em copas do mundo, o Brasil é o único que conseguiu vencer cinco vezes, tornando-se pentacampeão. Todo país pode e deve ter tantas vitrines quanto for capaz de criar. Não há dúvida que o futebol é uma das vitrines com mais visibilidade já criadas por brasileiros. O futebol, no mundo inteiro, tornou-se uma mercadoria, cuja comercialização, é capaz de enriquecer àqueles que fizeram e fazem dele um lucrativo negócio. E, não é de hoje que o futebol e outros esportes são utilizados politicamente.  Há sempre aqueles que buscam colher vantagens políticas, buscando induzir os pensamentos das massas tanto no sentido de aprovação como no sentido de desaprovação ou crítica.

Na condição de atividades lúdicas, desde sempre o futebol e os demais esportes podem servir à educação e à formação das crianças e dos jovens. Tanto o jogar como o torcer requerem aprendizados. A expansão e a contenção dos impulsos são necessárias à convivência harmoniosa e produtiva. Saber se aproveitar do lado bom das coisas e dos acontecimentos deixando à margem o lado ruim, mediante criteriosa reflexão, é uma decisão inteligente e sadia de se adotar.

Postado por José Morelli

quarta-feira, 29 de setembro de 2021

Aparelho digestivo

 Boca, laringe, esôfago, estômago e intestino são órgãos do aparelho digestivo. O processo de digestão dos alimentos se dá pela passagem destes, através de cada um dos órgãos mencionados. Ao entrar pela boca, os alimentos são o que são: arroz; feijão; carne; verdura; fruta; doce; salgado... Depois de digeridos, eles se transformam em nutrientes: vitaminas e proteínas que revigoram e dão força e energia às células de nosso corpo. A vida que antes estava nos alimentos passa a estar em nós. Por conta de todo esse processo é que, desde que nascemos, fomos nos desenvolvendo fisicamente... Nossos ossos foram crescendo, nossos músculos se fortalecendo e chegamos ao porte físico em que nos encontramos hoje. A boa digestão aproveita o melhor do que está nos alimentos e dispensa o que não serve.

Digerir é transformar, assimilar. Esse mesmo verbo é também utilizado para se referir aos pensamentos e ideias. Estes e estas devem passar por um processo mais ou menos parecido com o que se dá com os alimentos, na digestão. Nossa mente precisa fazer um trabalho de confrontar as ideias e os pensamentos novos com outros, já presentes desde longo tempo, e considerados bons e certos, antes de aceitar e assimilar os novos, incorporando-os em nossos juízos e avaliações. Barreiras de todos os tipos se interpõem a eles, colocando-os à prova. Só depois desse processo é que eles passam a adquirir mais força, transformando-se em convicções.

Somos também, muitas vezes, obrigados a digerir certos acontecimentos que nos são impostos pela vida. Uns de mais fácil assimilação, outros cuja aceitação exige grande esforço e boa de vontade. Fatos que nos são como que enfiados goela abaixo, obrigando-nos a engoli-los. Ficamos indignados, revoltados até!... Só o tempo e, depois de várias vezes o termos ruminado, ruminado, à semelhança dos camelos, é que conseguimos fazer com que se tornem melhor digeríveis, possibilitando que sejam incorporados à nossa visão de realidade.

Nossa mente pode ser subdividida em partes. O processo mental de assimilação não é tão simples como poderíamos talvez imaginar. Apegamo-nos a muitas coisas intelectual e emocionalmente. O processo de convencimento da totalidade de nosso ser é profundo e exige tempo para se realizar de forma completa.

Postado por José Morelli

domingo, 5 de setembro de 2021

Reis e rainhas de Festa do Rosário da Penha

Que lá do céu vem descendo uma coroa.

                                                                                 Ela vem do Reino da Glória.

                                                                                          Vamo pegá cum jeito, meu irmão,

                                                                                      essa coroa é de Nossa Senhora.”

Quando da visita da Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Rosário do bairro Alto de Pinheiros, de Belo Horizonte - MG, em junho de 2009, quando da missa celebrada pelo Padre Henúbio, antes que ele desse início à oração eucarística, o comandante do Moçambique pediu aos reis que entregassem suas coroas para que fossem colocadas sobre o altar. Terminada a missa, as coroas voltaram a ocupar as cabeças do rei e da rainha.

A simbologia desses gestos demonstra a profundidade do entendimento que a religiosidade popular possui da eucaristia: Jesus Crucificado, tendo em sua cabeça uma coroa de espinhos, por sua morte, entregou-se como Cordeiro Imolado pela redenção de toda a humanidade, elevando-nos a todos e a todas à dignidade de reis e de rainhas, de filhos e de filhas de Deus. Assim como no Calvário, Maria também é presente em toda eucaristia.

Em outro verso, cantado pelos grupos de Moçambique e de Congado, o comandante diz: “Sinhô rei escuta eu vou falar. Dá um passo à frente e vamo caminhar... Pegar a coroa que está no altar”.

No dia de nosso batismo, quando fomos ungidos com o óleo do crisma (o mesmo com que eram ungidos os reis do povo de Israel), o oficiante rezou sobre nós a seguinte oração: “Pelo batismo, Deus todo-poderoso libertou-vos do pecado e vos fez renascer pela água e pelo Espírito Santo. Vós fazeis agora parte do seu povo. Que Ele vos consagre com o óleo santo para que, como membros de Cristo, sacerdote, profeta e rei, continueis no seu povo até a vida eterna”. Participamos da missão de Jesus como sacerdotes, profetas e reis.

Nas páginas 118 e 119 do livro de “Assentamentos da Irmandade dos Homens Pretos da Penha de França – 1755 a 1780” além dos nomes dos afiliados constam registros dos anos de 1806, 1808 e 1809, onde estão relacionados os irmãos e irmãs que foram eleitos para dirigirem a Irmandade naqueles anos: do rei e da rainha; do juiz e da juíza; dos irmãos que compunham a mesa; do alferes da bandeira e do capitão do mastro”, de acordo com o que vem registrado no livro de minha autoria “Penha de França – Expressões do Rosário”, à página 22.

De acordo com o resumo histórico, contido na lápide existente na Igreja do Rosário da Penha, os irmãos e irmãs da Irmandade nos legaram como testemunho, a Solidariedade no Sofrimento. Em linguagem própria dos escravizados da época, a sabedoria de vida é expressa no seguinte verso: “Sinhá rainha sua casa cheira, cheira cravo e rosa e flor de laranjeira. Me dá a mão que te passo na pinguela. A pinguela é de imbaúba pó ter caruncho nela”. Desde que nos ajudemos mutuamente, mantemo-nos unidos como contas de um mesmo rosário.   

quinta-feira, 19 de agosto de 2021

LIVRE-ARBÍTRIO

 A ideia de livre-arbítrio tem seus fundamentos na própria natureza humana. Por sua racionalidade, os seres humanos, possuem conhecimento e consciência de si mesmos e das realidades que os envolvem. Possuem, ainda, a capacidade de escolher e decidir sobre o que devem ou não fazer. Por fim, conseguem ser criativos, inovando na busca de seus caminhos.

Já com os animais irracionais, isso parece não ocorrer, pelo menos, com a mesma frequência e intensidade. Suas vidas são regidas pelo instinto. As abelhas, por exemplo, ao construírem suas colmeias, com tanta perfeição, agem como se fossem programadas, a partir de um condicionamento, imposto por sua própria natureza a milhões de anos. Com as plantas, observa-se o mesmo. Desenvolvem-se regidas por leis, que as mantém sempre da mesma espécie. Alguns minerais, também, são formados por uma força de atração, que reúne seus fragmentos, dando-lhes formas peculiares.

Embora o livre-arbítrio dos seres humanos seja um consenso no mundo inteiro, garantido formalmente pelas constituições da maior parte dos países, o grau de liberdade de cada pessoa é relativo e não absoluto. Uma série de condicionantes incidem sobre cada uma delas, interferindo em suas decisões, podendo limitar sensivelmente o sentido de sua autonomia e liberdade.

A capacidade de discernimento das pessoas nem sempre lhes proporciona uma clarividência absoluta, propiciando-lhe que não tenha dúvidas, quanto ao que escolhe fazer. As possibilidades que lhes são oferecidas, grande parte das vezes, não incluem, exatamente, aquilo que gostariam de escolher. O que ocorre, com mais frequência é que, não podendo eleger o ótimo, resta-lhes, que se contentem em escolher o bom. E se, ainda, não lhes é possível o bom, que saibam aceitar, de boa vontade, o regular. Só dessa forma que o ótimo não se tornará inimigo do bom e que o bom não se tornará inimigo do regular. 

Buscar reconhecer-se no próprio direito ao livre-arbítrio, dimensionando-o em seu alcance e em seus limites é um caminho de amadurecimento para todo ser humano, consciente desta sua dignidade.

Postado por José Morelli

 

 

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

Manifesto e Latente

 Manifesto é aquilo que projetamos, de nós, para fora. Latente é o que, de nós, procuramos esconder aos outros, impedindo que apareça. Tanto o manifesto, como o latente faz parte de nossa maneira de ser completa. São como faces de uma mesma moeda.

Se quisermos ser bons e honestos, o que permite orientarmos nossa vida através desses preceitos é o sentido que trazemos do que não é bom e honesto, para nós, e do que não o é. Tentamos fugir de tudo o que tem características de maldade e de desonestidade. Na forma de ideias, estão, em nosso pensamento, o bem e o mal. Em nosso sentimento, essas ideias que, por qualquer movimento mais brusco, podem trincar e mesmo quebrar-se.

Na medida em que fortalecemos o pensamento, aprofundando o sentido das coisas e encaramos os próprios sentimentos, reconhecendo-os na força e na fragilidade que lhes são próprios, desmascaramos e desvendamos a ambivalência que existe em nós.

Policial e bandido se complementam em suas funções. Ao primeiro cabe agir de forma a inibir e coibir a ação do bandido, considerada como um mal para a sociedade. O bandido procura ludibriar o policial o quanto lhe é possível. O que é manifesto em um está latente no outro e vice-versa. O bom policial, no seu outro lado no seu latente, tem que ser tanto ou mais esperto na malandragem, na arte da maldade, do que o bandido, para poder superá-lo.

Muitas vezes, o incômodo que sentimos por certos defeitos em outras pessoas, se deve, justamente, a esse tipo de semelhança. No latente, esses defeitos nos ameaçam, nos dão medo. A forte ligação emocional de repulsa e o nosso inconformismo fazem com que nos incomodemos tanto: Somos demais parecidos com aqueles ou aquelas com quem não queremos nos assemelhar.  

Postado por José Morelli

sexta-feira, 16 de julho de 2021

“Oi Vó!... Oi vô!...”

Sant’Ana e São Joaquim são os pais de Maria, a Mãe de Jesus. Os colonizadores portugueses tinham grande devoção à avó do Menino-Deus, encontrando-se daquele período histórico numerosas imagens da mesma, talhadas em madeira, em muitos lugares do Brasil. Traduzindo esta devoção, os  jesuítas deixaram claramente registrado em documentos esta escolha, desde os primórdios da futura grande metrópole paulistana, hoje a maior cidade da América Latina.

No Santuário Eucarístico de Nossa Senhora da Penha, o altar-mor possui três nichos: o do centro contém a imagem de Nossa Senhora da Penha com o Menino Jesus nos braços. Este traz na mãozinha esquerda uma pequena esfera azul, símbolo do globo terrestre; no nicho da esquerda, encontra-se a imagem de Sant’Ana instruindo, com as sagradas escrituras, a filha ainda menina. O nicho da direita contém a imagem de São Joaquim, que carrega um cesto com dois pombinhos. Aos mais pobres, era permitido que ofertassem estas pequenas aves ao invés de cordeiros, quando levavam o filho ou filha para serem apresentados no templo, conforme exigia a lei de Moisés no Antigo Testamento.

Em síntese, encontram-se no altar principal do santuário da Penha: os avós Joaquim e Ana, a filha Maria e o neto Jesus em seu colo. Três gerações de uma mesma família, consideradas pelo lado da mãe. Desta, Jesus recebeu sua herança genética humana, seu DNA, base material necessária ao desenvolvimento de sua alma, sopro de vida divino, transmitido por Deus à semelhança do que havia acontecido com Adão, quando este atingira a maturidade/capacidade em seu processo de evolução mental e de consciência de si e do mundo no qual vivia.

No que diz respeito à história do bairro da Penha, não poucas narrativas demonstram que, desde o surgimento da pequena ermida de Nossa Senhora da Penha, lá pelos idos de 1667, acontecimentos extraordinários chamaram a atenção dos paulistanos para o carinho com que a Mãe de Jesus, invocada sob o título de Nossa Senhora da Penha, atendia às necessidades pessoais e comunitárias. Quando a cidade sofria com o flagelo de pestes e de outras doenças, muito comuns na época, bem como de secas prolongadas, o povo e as autoridades civis e religiosas promoviam idas da imagem para o núcleo central da cidade, onde eram feitas preces especiais. Em contrapartida, no mês de setembro quando eram comemoradas as festas no bairro, eram os paulistanos de todos os cantos da cidade que vinham para a Penha.

Sant’Ana e Maria, sua filha, guardam um segredo entre si. O altar-mor do Santuário da Penha desvenda esse segredo. Nele, o Menino Jesus tem o mundo em sua mão: “Todo o poder Lhe foi dado no Céu e na Terra”. Maria sustenta Jesus em seus braços. No nicho à direita do de Maria, está a imagem de sua mãe, Sant’Ana, padroeira oficial da Cidade de São Paulo. Por um trato entre as duas, Maria seria a padroeira de fato, cumprindo o papel que lhe dera o próprio Jesus, no alto de sua cruz

A proteção de Nossa Senhora da Penha se concretiza pelo anúncio de que somos todos irmãos em Jesus e por Jesus. Ao nascer em Belém, os anjos anunciaram: “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade”.  A paz é construída por meio da justiça e do amor entre todos.

Quando formos visitar a catedral da Sé ou o velho santuário da Penha, saudemos Sant’Ana dizendo-lhe:  “oi vó!... oi vô!...” obrigado por nos terem dado Maria, a quem Jesus nos deu como Mãe de cada um de nós, irmãos entre nós, por Jesus e em Jesus.

Postado por José Morelli

quinta-feira, 27 de maio de 2021

Bom ouvinte

A natureza, em sua sabedoria, dotou os humanos e a quase totalidade dos animais com dois ouvidos para ouvirem e uma boca, apenas, para falar. Uma proporção de dois para um. A fala de cada indivíduo é resultado de suas conclusões pessoais, enquanto que o que seus ouvidos ouvem é produto da elaboração de muitos. A proporção de dois para um, portanto, pode representar certo equilíbrio na arte de fazer uso da própria audição e da própria fala.

Dependendo das circunstâncias de vida de cada pessoa, o ato de revelar-se pela fala não é tão fácil de ser realizado como se poderia supor. Não são poucos os que, por alguma razão, criaram obstáculos à própria comunicação encontrando grande dificuldade de falar de si mesmos. Um mínimo de confiança no outro é condição indispensável para que alguém se sinta encorajado a se revelar em suas dúvidas, segredos e intimidades.

Bom ouvinte é aquele que consegue dar mostras de sua capacidade de acolher e de ouvir o que o outro tem a lhe dizer. As pessoas se constroem cada uma à sua maneira. Não há quem possa viver em total solidão. Nenhum ser humano é uma ilha, como se costuma dizer. As pessoas se complementam em suas necessidades. A sociedade, considerada em seu conjunto, precisa tanto daqueles que desenvolvem a capacidade de falar com propriedade como daqueles que desenvolvem a capacidade de ouvir, especializando-se como bons ouvintes. O sentido de segurança pessoal precisa ser reforçado por algum consenso ou concordância dos próprios juízos e entendimentos. Para acreditarem em si mesmas, as pessoas precisam de certa aprovação quanto ao que pensam, sentem e imaginam.

Ao falar de si mesmo, o indivíduo também se ouve. Sua fala sai de sua boca e entra por seus ouvidos. Dos ouvidos, volta à mente, permitindo que os pensamentos sejam reformulados, caso isso seja necessário. Para ser entendida, a fala precisa de um mínimo de organização: pensamento e emoção devem se encaixar e se contemplar mutuamente em suas importâncias Esse é um processo que ajuda na reformulação da própria identidade pessoal e do meio em que vive. Um verdadeiro tratamento psicológico que ajuda no desenvolvimento da saúde mental e emocional.

Postado por José Morelli

  

quarta-feira, 19 de maio de 2021

Vasos comunicantes

 Se, num lugar em que chega pouca água, devido à altura em que este  este se encontra, os moradores têm que fazer reserva durante a noite, quando o consumo da cidade é menor, é recomendável que as casas disponham de duas caixas d’água no lugar de uma. Normalmente, a água vinda da rua entra através de uma das caixas. Para passar à outra caixa é colocado um cano interligando as caixas, na altura de sua base, com um pequeno declive da primeira para a segunda.

Na medida em que a água vai entrando na caixa principal, esta vai passando à caixa sobressalente. Na física, este experimento pode ser chamado de “vasos comunicantes”. A diferença na quantidade de água de cada caixa depende do diâmetro de cada uma. A que tiver maior diâmetro conterá maior quantidade de água. O nível das duas permanecerá sempre o mesmo.

A comparação que este exemplo permite é simples, sem dúvida, mas serve para mostrar um fator que não acontece apenas com os vasos comunicantes, sejam eles compostos por dois ou mais compartimentos, à semelhanças das caixas d’água acima citadas. Uma interligação também acontece com as pessoas em suas interações. Quanto maior a profundidade dos afetos existentes, maior será a fluidez com que as emoções mútuas são compartilhadas.

A própria condição de “gente”, comum às pessoas, pode ser comparada ao cano que ligas as caixas d’água compartimentadas.

Não é sempre que se percebe a passagem das influências (boas ou más) que todos recebem do ambiente, dos acontecimentos e das outras pessoas. Inconscientemente, muitas dessas influências vão entrando e se acumulando. As tensões do momento são captadas e o estresse ou desgaste pode ter, nesse fato, um de seus agravantes.

No campo da espiritualidade, algo parecido com esse fenômeno pode ser reconhecido na chamada doutrina da “comunhão dos santos”. A graça nunca seria individual apenas mas compartilhada com o coletivo.

terça-feira, 4 de maio de 2021

"Sair da casca"

 As cascas, que envolvem a maior parte dos frutos existentes nas diversas espécies de plantas e árvores, se assemelham às embalagens que a natureza, em sua sabedoria, projetou e concretizou. Até que amadureçam, os frutos precisam da proteção de suas cascas. Para que a água e a polpa do coco sejam extraídas é preciso furar e/ou quebrar a casca do fruto.

Diferentemente das embalagens industriais, as produzidas pela natureza não degradam o ambiente. Estas, pelo contrário, até passam a servir como excelentes fertilizantes da terra, ajudando para que outras plantas possam continuar a se desenvolver e a produzir novos frutos.  A necessidade das cascas perdura por um determinado tempo. Quando os frutos amadurecem, é imprescindível que saiam naturalmente ou sejam retirados de suas cascas, a fim de que possam cumprir o papel para o qual foram destinados, que é o de servir ao sustento de animais e de pessoas.

Os seres humanos também, de forma comparativa, constroem proteções (cascas) nos seus juízos e sentimentos. Em dados momentos, essas cascas são necessárias. Porém, na medida em que vai se dando o amadurecimento de cada indivíduo, aquilo que era proteção necessária passa a ser impedimento ao desenvolvimento pleno.

Os perigos que envolvem a vida humana podem ser reais ou imaginários. Os mecanismos que a mente idealiza para se proteger dos perigos (internos ou externos) ora são reais e legítimos ora não encontram justificativas. De maneira subconsciente, a mente se utiliza de mecanismos de defesa para evitar que se exponha a sofrimentos. O desvendamento desses mecanismos, juntado à coragem de enfrentá-los, se constituem como forma de quebra e de saída da própria casca.

A castanha é um fruto bastante apreciado por seu sabor e qualidades nutricionais. Para poder servir ao consumo; no entanto, é preciso retirá-la de sua casca, tarefa nada fácil. A casca da castanha é envolvida por duros espinhos. Para não se machucar, é preciso quebrá-la com algum instrumento: um pedaço de pau ou martelo. A tarefa de quebrar a própria casca do eu e sair dela pode ser comparada à retirada da casca da castanha. Além da vontade firme é preciso boa dose de coragem e determinação na constante busca do autoconhecimento e do auto-redirecionamento.

   

segunda-feira, 5 de abril de 2021

Pensar com o corpo

 Fomos acostumados a entender que o ato de pensar é um atributo exclusivo da mente. Ao corpo seriam atribuídas outras funções, tidas como de natureza material apenas e passíveis de serem mensuradas, tocadas e identificadas pelas formas e cores, pelo sabor e pelo odor que exalam, pelas sensações que provocam na pele. O cérebro, de acordo com a mentalidade ocidental, é aquela parte do ser humano que, mesmo estando em nosso corpo e fazendo parte dele, é capaz de abstrair dele, criando ideias e tendo consciência de si mesmo: do que é e do que faz.

Não seria à toa que o cérebro, centro onde se desenvolvem os pensamentos e raciocínios, se encontraria acima da altura dos olhos, posição indicativa da importância que possui, relativamente às outras partes, responsáveis por atividades corporais específicas, de natureza puramente vegetativa e materialista. Mente, pensamento, consciência, alma. Corpo, matéria, partes fragmentadas em constantes mutações. Por estas e outras razões, é que durante muito tempo a mente se envaideceu de ser a única responsável pelo ato de pensar. Ao corpo sobraram apenas funções de menor status e consideradas sem a mesma importância.

Porém, como ensina o dito popular: “A verdade tarda, mas não falha”. Foi preciso que muita água passasse debaixo das pontes, para que o próprio pensamento se visse enredado em mil complicações, dando-se conta de que seus raciocínios já não eram tão seguros, como se vinha imaginando anteriormente. A mentalidade oriental veio em socorro da ocidental. Culturas mais antigas, desenvolvidas em tempos a perder de vista, despertaram para valores esquecidos e que continham sabedorias não dispensáveis para uma boa conceituação de como se forma o pensamento humano.

Mente e corpo se complementam, mediante recíprocas trocas de mensagens. Das trocas mútuas que realizam surgem novas e novas conclusões. No braço de ferro entre razão e afeto, a tendência é a de que, na maior parte das vezes, é o afetivo que se efetiva e não a lógica da razão.

Para aprendermos a pensar com o corpo precisamos, em primeiro lugar, abrir nossa mente para o entendimento e aceitação dessa possibilidade. Em segundo lugar, permitir-nos experimentar o encontro de nós mesmos com a vida que nos anima a nós e aos outros com os quais nos relacionamos, lidando com ela de uma maneira abrangente, sábia e harmoniosa.

Postado por José Morelli

 

segunda-feira, 29 de março de 2021

Saber perdoar-se para conseguir perdoar

 Consegue perdoar-se e perdoar quem é capaz de enfrentar a própria fraqueza e falibilidade, superando a exigência neurótica de perfeição, que carrega em seu íntimo. Das experiências consigo mesmo, decorrem de forma instantânea as interações que estabelece junto aos outros.

Páscoa é apelo de paz, amor e superação. Mas; na contingência humana, os bens da paz, tão enaltecidos nesta época do ano, não são possíveis sem o perdão mútuo: sem o perdoar-se e sem o perdoar efetivos. O perdão, assim entendido, é um valor positivo, uma qualidade indispensável ao desenvolvimento das melhores forças construtivas humanas: princípio de inclusão mais do que de exclusão entre todos.

O todo precisa de suas partes, integradas entre si, para não se fragmentar, assim como aconteceria com um corpo que se dissociasse em seus membros. As desigualdades sociais entre os seres humanos separam a humanidade em partes desiguais, que acabam se antagonizando. Em sua consciência mais profunda, a humanidade sabe que as partes que a compõem precisam ser rejuntadas constantemente, a fim de esta possa manter a própria integridade. Daí a necessidade de parar, voltando-se para o próprio interior, reencontrando-se e harmonizando-se em tudo o que faz parte da própria realidade, incluindo a do meio ambiente que a envolve.

Ninguém pode dizer que seja fácil perdoar-se para conseguir perdoar. Não é fácil mesmo, mas é algo capaz de gerar pensamentos e sensações positivas de harmonia e de felicidade.

A celebração da morte e ressurreição de Jesus é um convite a um recomeço, a uma retomada de si, a um reordenamento daquelas questões que ficaram mal resolvidas, dissociadas e em desordem, um convite a um entrelaçamento consigo mesmo e com o outro, a fim de que voltem a caminhar juntos, com mais alegrias no viver e no conviver.  

Postado por José Morelli

quinta-feira, 25 de março de 2021

Saber perder

 Este é o título de um livro, pequeno no tamanho; porém, importante no valor de sua mensagem. Ele foi escrito por Chiara Lubick, fundadora do Movimento Focolare. A tese nele desenvolvida pode se resumir no seguinte: “quem sabe perder: não perde, ganha; quem não sabe perder: perde, realmente”. Gostaria que você, leitor/a, refletisse e avaliasse se existe ou não consistência nesse entendimento. 

É claro que, para quem é imediatista e quer tudo para ontem, para quem só vale levar vantagens, fica difícil aceitar qualquer perda, mesmo que esta seja por apenas alguns poucos momentos. A vivência de cada um de nós pode demonstrar, na prática, que não é fácil saber perder. A sensação de angústia provocada pela perda, a incerteza de que dela possam reverter ganhos e mesmo o conformismo, expresso no dito popular: “mais vale um pássaro na mão, do que dois voando”, exigem autocontrole e segurança pessoal. Sem um mínimo dessas capacidades não é possível a prática do saber perder. Quem não possui essa estrutura mínima é porque não consegue se possuir e, consequentemente, se sentir seguro quanto à possibilidade de se apoderar do que está ao seu alcance.

Constatar e assumir a falta de estrutura pessoal que permita maior tolerância à frustração já é a aceitação de uma perda: primeiro passo para uma tomada de atitude no sentido de buscar formas de transformá-la em algum possível ganho. Acredito que a aceitação dessa realidade seja fundamental para construção de uma personalidade mais amadurecida.

O entendimento de que os filhos não são dos pais, não pertencem a eles, é um juízo próprio de quem é adulto o suficiente para entender a vida pelo que ela é. A observação tem demonstrado como a ânsia de ter o filho só para si, com exclusividade, acarreta como consequência uma perda ainda maior do filho. Mesmo que, aparentemente, o filho esteja aceitando essa imposição, o sentimento dele, machucado pelo fato de não ter sido respeitado em seus direitos, o dividirá ao meio, exacerbando lhe a raiva dentro de si.

É preciso perceber todo o ganho embutido na perda de se conceder ao filho o direito de ser para si mesmo, de assumir a própria responsabilidade, de poder se vincular às outras pessoas e, com elas, compartilhar do próprio existir. Sem querer tornar absoluta a ideia do que foi exposto até aqui, termino com um alerta: todas as vezes em que se teme demais perder alguma coisa, corre-se um risco ainda maior de não conseguir concretizar esse objetivo  tendo em vista a maneira inadequada de busca-lo. 

Postado por José Morelli  

sábado, 20 de março de 2021

Orelhas

 Ou melhor: ouvidos externos. Em conjunto com os ouvidos internos, as orelhas compõem os chamados órgãos da audição. As orelhas humanas, como a dos outros animais, se posicionam no corpo de forma estratégica para poderem cumprir sua finalidade primordial que é a de ouvir os sons ambientes.

Diferentemente da boca que exerce a função de transmissora de mensagens; os ouvidos, com a colaboração das orelhas, exercem a função de receptores de mensagens. Em geral, pouca atenção é dada às orelhas, principalmente quando elas não se sentem incomodadas por nenhum desconforto.

Na cabeça, as orelhas se encontram à direita e à esquerda, quase que na mesma altura dos olhos. Estes também têm função parecida que é a de captar ou trazer para o cérebro as imagens externas. Suas formas lembram as das conchas encontradas nas praias do mar, o que as ajudam na captação dos sons e introdução destes para a parte interior dos ouvidos, onde se encontram o tímpano, a bigorna e o martelo. As formas das orelhas também se assemelham ao feto humano, resumindo cada uma de suas partes. A acupuntura faz uso dos pontos localizados nas orelhas para tratamentos de diversos tipos de doenças.

As orelhas têm função estética. Umas se enquadram no conjunto com mais harmonia, outras destoam. Não são poucos os simbolismos atribuídos às orelhas por diversas razões. Popularmente, é comum associá-las à burrice. Mania de desprezar a quem muito ajuda, um típico exemplo de preconceito contra esse animal, que tantos serviços tem prestado ao homem.

As orelhas talvez possam ser consideradas um tanto esquecidas ou distraídas. Dizem que elas nunca param de crescer. Mesmo na velhice elas ainda continuam crescendo.

As orelhas servem ao acolhimento. Não são muitos aqueles que se predispõem ouvir aos outros. Falar, esvaziar ou extravasar o que sobrecarrega dentro é uma necessidade, inclusive para a recuperação do equilíbrio psicológico. Bons ouvintes são capazes de colocar suas orelhas a serviço da nobre tarefa de ouvir com paciência ao outro, acolhendo as queixas e desabafos que ele tem para fazer e ajudando-o a se reencontrar em suas desordens mentais e emocionais.     

Postado por José Morelli

sexta-feira, 5 de março de 2021

Mexa-se

 A vida se manifesta através do movimento. Este, portanto, para o ser vivente se constitui como regra, enquanto que a imobilidade se constitui como exceção. Exercitar cada parte do corpo, movimentando-a, faz desenvolver os músculos, tonificando-os e dando-lhes destreza e elasticidade. O sistema nervoso central é quem estabelece a ligação entre o corpo e a mente, responsável pelos comandos e pela conscientização de tudo que se faz ou se deixa de fazer. A mente possui a capacidade de associar idéias, atribuindo-lhes significados. Estes, por sua vez, concorrem na mobilização de emoções e de sentimentos.

Jovens ou adultos precisam se movimentar. Aqueles para que se desenvolvam e atinjam a plenitude do que lhes é dado alcançar. Estes para que se mantenham, por mais tempo, com as boas condições físicas que conseguiram alcançar, enquanto estavam em sua fase de crescimento e de desenvolvimento.

Para que o exercício físico seja bom e ajude na saúde é preciso que, tanto a mente como o corpo estejam em harmonia, concordando no que um propõe ao outro. Tudo o que se faz contrariado não deixa de acarretar algum prejuízo. Este é o caso das chamadas lesões por esforço repetitivo (LER). Estas acontecem quando alguma parte do corpo compromete sua boa condição de saúde por conta de movimentos executados em exagero ou de forma inadequada. Se um indivíduo se sente desrespeitado em sua dignidade pessoal tendo em vista sobrecargas de trabalho ou de remuneração aviltante, esses condicionantes psicológicos podem ocasionar-lhe problemas de inflamação muscular localizada.

Mexer-se, de maneira coordenada e harmoniosa com o todo do próprio corpo e com o ambiente que se encontra à sua volta, além de sinalizar a presença de vida latente, ajuda no desenvolvimento da saúde física e emocional do indivíduo.  

O nadador faz uso da água para se impulsionar para frente. Seu corpo em movimento se coaduna com a força e o volume da água. A respiração também é mais um movimento a compor-se com os outros, necessários a consecução de um bom desempenho. A concentração do pensamento se dá na mente. É esta que tem o papel de se focar em seus próprios objetivos.

Qualquer lugar pode servir para exercitar-se no próprio corpo. Mesmo deitado na cama é possível a realização de muitos de seus movimentos, que contribuem para o aprimoramento da saúde do corpo em seu todo e em cada uma de suas partes. 

Postado por José Morelli

 

 

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Libido

 Esta palavra, emprestada do latim, é muito utilizada pela psicologia. Libido é o mesmo que desejo ou força que impulsiona o desejo. Toda libido tem um objeto para o qual se lança, à semelhança de uma flecha. Os anjinhos, chamados de “cupidos”, carregam um arco e flechas, com as quais ferem de amor os corações dos enamorados. Cupíditas é outra palavra latina que também significa desejo ou atração afetiva e sexual. 

A libido é uma energia, um dínamo, um motor que faz movimentar a vida das pessoas e, através destas, a vida do mundo. Pela libido, os humanos se desejam mutuamente, atraindo-se uns aos outros como ímãs. De nada valeria apenas a matéria se esta não pudesse se mover de um lado para o outro, se esta não pudesse se modificar a partir de alguma dinâmica interna, que a transformasse e a renovasse conscientemente.

Em cada ser humano a libido funciona utilizando-se da pessoa em sua totalidade: suas faculdades mentais e emocionais e seu corpo, com os cinco sentidos e todos os mecanismos, que fazem movimentar os diversos sistemas que nele atuam. À força do desejo, o corpo responde mobilizando-se através de ações concretas. A vida se faz sentir e se afirma, provoca emoções e encontra sentido no que lhe acontece. 

A libido é um grande bem da vida. Porém, como todo bem, esta força que impulsiona a vontade pode se orientar para direções opostas, tanto  no sentido da construção como da destruição. A libido não é a única força que faz movimentar a vida das pessoas. Por isso, esta precisa dividir seu poder com outras forças, como as da razão e do senso comum, a fim de que indivíduos e sociedade possam assegurar os melhores resultados no compto geral de suas trajetórias. 

No contexto histórico em que a libido se constrói, na vida de cada indivíduo, esta se defronta com situações que ou podem favorecer o seu desenvolvimento ou o podem prejudicar. Nem todos conseguem desenvolver uma capacidade libidinal equilibrada, capaz de facilitar as interações que estabelece com o meio em que vive. O querer o outro e o esperar dele reciprocidade pode se tornar dramático. 

Experiências negativas, vivenciadas nos primórdios da vida, podem marcar com inseguranças a projeção do próprio ser. O medo de não ser correspondido pode ser devastador. A inadequação do comportamento pode levar a uma sucessão de fracassos, que reforçarão, ainda mais, a falta de confiança de poder concretizar os próprios desejos.

Postado por José Morelli

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Instrumentalizar em função de...

As coisas, as armas inclusive, pelo que elas são em si mesmas, não são passíveis de conotação moral: são indiferentes. Ganham conotação moral dependendo do por que e da maneira como são instrumentalizadas. O dinheiro, que é um meio tão fluido em sua capacidade de troca, pode rápida e facilmente se transformar em outras coisas boas ou ruins, dependendo de uma série de fatores ou circunstâncias. Se um bem qualquer for instrumentalizado em função de algo construtivo, a consequência será uma; porém, se for instrumentalizado em função de algo destrutivo, a consequência certamente não será benéfica e sim prejudicial. O dinheiro pode ser instrumentalizado tanto para a compra de um alimento que ajuda na saúde e bem estar, como para a compra de uma droga que leva à desintegração da mente e da saúde do próprio corpo.

No pensamento e na intenção de Santos Dumont, Pai da Aviação, seu invento deveria ser instrumentalizado em função de uma vida melhor para a humanidade, proporcionando mais conforto e rapidez nas viagens; no entanto, qual não foi sua decepção quando viu os aviões dos seus sonhos bombardeando a cidade de São Paulo, durante a revolução constitucionalista de 1932. Essa instrumentalização de seu invento em função da discórdia e não da concórdia, numa contenda fratricida, fez com que ele caísse em uma tão profunda depressão a ponto de suicidar-se.

A religião pode ser instrumentalizada em função de uma aproximação com os outros ou pode ser instrumentalizada em função de uma desagregação, tendo em vista a vaidade de quem a pratica, julgando-se melhor do que os outros. A posse de um carro pode ser instrumentalizada em função do bem viver próprio e da família ou pode ser instrumentaliza em função da possibilidade de zoar irresponsavelmente, colocando-se a si e aos outros em risco de se acidentarem e de até perderem a vida.  A força física, a inteligência, a sexualidade podem, também, serem inadequadamente instrumentalizadas.

Para quem não tem autocrítica, instrumentalizar coisas ou acontecimentos, apenas e exclusivamente, em função dos próprios interesses, denota uma incapacidade ética de reconhecer o outro em sua importância, um fechamento no próprio egoísmo e egocentrismo.

Postado por José Morelli

 

sábado, 13 de fevereiro de 2021

Incluir/excluir

 Estas duas palavras se utilizam do mesmo verbo proveniente do latim. O que as diferenciam é o uso do prefixo que o antecede. Enquanto a primeira, se utiliza do prefixo in: dentro, a segunda se utiliza do prefixo ex: fora. Assim, os sentidos desses dois verbos indicam orientações diametralmente opostas. Incluir é o mesmo que trazer para dentro ou para perto, aceitar, compreender, inserir. Excluir, de acordo com o Google, é o mesmo que manter do lado de fora, não permitir a entrada, não dar um privilégio, não considerar. Com frequência, esses verbos são também utilizados na forma passiva ou reflexiva: incluir-se e excluir-se.

Mais importantes que as palavras são as ações concretas que estas representam. Incluir ou incluir-se, excluir ou excluir-se são atitudes que podem envolver coisas ou pessoas. No caso de envolvimento de coisas, a inclusão ou exclusão podem ser vistas e/ou sentidas com maior isenção de ânimo. No caso de envolvimento de pessoas, a inclusão ou exclusão podem ser vistas e/ou sentidas com maior densidade emocional.

É voz comum que o sistema que rege as relações humanas na contemporaneidade incentiva ao individualismo das pessoas. Essa tendência decorreria das facilidades com que os indivíduos conseguem se privilegiar, buscando se compensar frente às suas próprias angústias, geradas pela insegurança quanto à própria sobrevivência física e/ou emocional. Não conseguindo serem donos de si mesmos, os indivíduos seriam levados para o lado em que o vento bate mais forte, não desenvolvendo suas capacidades de dimensionar a realidade de forma mais objetiva e abrangente.

 A opção de adotar posturas individualistas ou altruístas exige capacidades desenvolvidas a partir de um aprendizado mais aprofundado de si mesmo e do outro e do valor inerente a cada um e todos indistintamente. Do velho latim, duas frases podem ilustrar as consequências que, normalmente decorrem dessas duas posturas: bonum est difusivum sui e malum est difusivum sui. Traduzindo: Tanto o bem como o mal tendem a se difundir a partir de uma força que lhes é inerente.

Postado por José Morelli

 

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

"Inflar o ego"

É como se o ego fosse uma bexiga e pudesse ser enchido ou inflado. Foi dito: “como se”, uma vez que o ego não se constitui como realidade material, mas sim como uma capacidade mental/emocional própria dos seres racionais. Com essa capacidade os humanos captam e criam representações da realidade dando-lhe sentidos que passam a servir-lhes como referência. O ego é a dimensão do que cada um pensa e sente de si mesmo, de como é ou se apresenta a realidade existente fora de si e, por fim, como se dá a interação entre ele próprio e os outros e com o mundo à sua volta.

Um ego vazio dá a sensação de fraqueza ou impotência e, consequentemente, de insegurança. Um ego cheio dá a sensação de força e de poder perante si mesmo, perante o outro e perante as condições com que se apresenta o mundo ou a vida fora. A segurança pessoal depende de como o ego consegue ver e sentir a realidade nua e crua, despojada de ilusões, sonhos e fantasias.

“Alimentar o ego” é o mesmo que inflá-lo. Reconhecimentos na forma de elogios alimentam, dão sustentação a ele. “Saco vazio não para em pé” é o que ensina a sabedoria popular. O sucesso é o retorno daquilo que se faz. Fama, prestígio, riqueza podem ser recompensas que alimentam o ego. Quem se encontra nutrido fisicamente tem energia para gastar: correndo; trabalhando, se divertindo. Quem se encontra nutrido psicologicamente tem energia mental/emocional para fazer as coisas com energia e ânimo, empenhando-se em sua totalidade, com espontaneidade e criatividade.

Quem reconhece e dá valor só às coisas materiais deixa de dar importância às realidades imateriais ou que transcendem, ultrapassam ao físico. Esse não reconhecimento e não valorização tem um preço. A falta do referencial espiritual impede o desenvolvimento do ser humano em sua integralidade.

Pequenos gestos podem alimentar o ego: um olhar de atenção; um sorriso; uma palavra de estímulo ou de elogio; uma reflexão pessoal; a leitura de um texto capaz de ser entendido e que ajude numa maior compreensão de si e da vida; a superação de um problema de saúde ou de algum trauma psicológico; o reconhecimento objetivo das próprias limitações, a superação da tendência de fugir, de negar aquilo que desagrada ou causa algum incômodo.   

Postado por José Morelli

sábado, 6 de fevereiro de 2021

Indução

 Do verbo “induzir”, que significa influenciar alguém, conduzi-lo a partir de fora. Existem idéias que já se encontram em nossa mente, fazem parte de nossos pensamentos. Existem outras que ainda não se encontram registradas e catalogadas em nosso consciente e que, pouco a pouco, nos chegam a partir de nossa interação com o meio externo. Julgamos a importância delas, entendemos que podem nos ajudar a compreender os enigmas da vida, sejam estes do âmbito pessoal ou universal. Nesse processo, acabamos por assimilá-las, incorporando-as em nosso repertório pessoal de idéias, com as quais já nos encontramos familiarizados.

Somos receptores de idéias. Captamos conhecimentos através de nossos cinco sentidos. Um bom receptor precisa estar bem sintonizado. Para captar os sinais de uma emissora, um aparelho de rádio precisa ter o seu dial bem ajustado ao número certo em que esta transmite sua freqüência. Se não o estiver, haverá uma distorção da mensagem. Ruídos dificultam ou até mesmo impedem sua compreensão.   

Momentos certos de induzir. A mente humana tem seus momentos especiais, em que se encontra melhor predisposta a ouvir e a assimilar aquilo que lhe chega de fora. Quando ela se encontra dispersa, avoada, não consegue prestar a devida atenção e, consequentemente, pouco é capaz de reter e assimilar. Os graus de concentração podem ser vários. Vivemos no tempo. Precisamos tê-lo como amigo e não como inimigo. A ansiedade nos coloca em conflito com o tempo. Queremos atropelá-lo. Perdemos o foco daquilo que nos acontece à volta. Nossa mente consegue melhor captar as contribuições que recebe, na medida em que se encontra atenta e focada naquilo a que está se dedicando.

A existência de problemas que exigem respostas urgentes é outra predisposição importante, que ajuda a mente na assimilação das boas palavras, ensinadas pela própria vida das mais variadas formas. Quanto maior o problema, maior é a necessidade de se encontrar solução para o mesmo. Se, da dor, se pode tirar algum proveito, este é um deles, sem a menor sombra de dúvida. De duas uma: ou se fica com a dor acostumando-se com ela ou se busca algo que a mande embora.

Postado por José Morelli

domingo, 31 de janeiro de 2021

Como funcionam os sentimentos?...

 Bem ou mal comparando, podemos dizer que os sentimentos funcionam como o clima. Os sentimentos são um clima interior. As condições do tempo nos atingem de fora pra dentro, provocando, facilitando ou dificultando nossas ações. Se é frio ou calor, se o ar é úmido ou seco, se a pressão da atmosfera é alta ou baixa variam nossas sensações físicas. Os sentimentos de alegria, de tristeza, de angústia, de ansiedade, de ciúmes, de inveja, de raiva ou qualquer outro, da mesma forma, influenciam em nosso ânimo e em nossas ações, podendo provoca-las, impedi-las, facilitá-las ou dificultá-las em sua execução.

Podemos, também, comparar os sentimentos com o pano de fundo de um palco: as figuras, as cores, a intensidade das luzes representam o ambiente em que se desenvolvem as cenas. As tonalidades das cores, simbolicamente, representam as emoções que devem ser provocadas na plateia. A montagem de um teatro, de uma coreografia, de um show, exige arte na escolha das cores no cenário e da iluminação, capazes de suscitar emoções de acordo com o sentido da música, da ação ou do texto. Funcionam como agentes externos, capazes de mobilizar sentimentos.

Os acontecimentos do dia a dia são estímulos desencadeadores de emoções. Eles podem ser ações, palavras, sons, perfumes, sabores, etc. Desde que cheguem à nossa mente, instantaneamente, buscamos significados para eles, encaixando-os de acordo com alguma lógica de entendimento. Nessa busca, relacionamos esses acontecimentos a outros, antigos ou recentes, guardados em nossa memória. A fantasia faz associações e imagina coisas, até aparentemente disparatadas. Como resultado de todos esses processos mentais surgem os sentimentos.

Situações vividas e que não temos como conscientes, também podem servir a esses processos mentais, tornando mais difícil a compreensão da origem e fonte de onde emanou o sentimento. É por isso que não entendemos como fatos em si mesmos insignificantes, podem provocar emoções tão fortes e tão incômodas, que nos impactam tanto.  

Podemos ter apenas certo domínio dos processos que regem o funcionamento das emoções em nós. Não será possível termos um domínio total e isso nem seria bom. Perderíamos a espontaneidade e tudo se tornaria frio e calculado, sem riscos, mas também sem nenhuma vibração e/ou adrenalina. 

Postado por José Morelli 

 

sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Com que tintas?...

Essa deveria ser uma pergunta que todos nós, tranquilamente, deveríamos fazer ao vermos imagens de indígenas brasileiros, com seus rostos e corpos sofisticadamente pintados. Certamente, eles não nasceram assim, tão coloridos, como se apresentam em fotografias e em filmagens que despertaram e despertam a atenção de muitos, seja aqui no continente americano seja em terras de além mar. Os europeus dos tempos pós-descobertas, tinham imensa curiosidade de saber a respeito da vida vivida pelos silvícolas brasileiros, bem como de seus costumes e tradições.

O conhecimento das tintas pelos indígenas remonta a tempos imemoriais. Ao contrário do que se ouve dizer, a arte indígena não pode ser vista como pouco elaborada. A partir da observação da natureza, esses povos primitivos representam formas geométricas que, pela variação de tamanho, manifestam ritmo e equilíbrio, sendo que cada tribo tem o seu próprio estilo.  Quanto à fabricação das tintas, utilizando-se de sementes de plantas, tais como as do urucum, as do jenipapo e as do urucuzeiro, esses povos produzem uma tinta natural que não prejudica a própria pele, como acontece nas tintas fabricadas com agentes químicos industrializados. 

As pinturas corporais são apenas um dos elementos constitutivos da cultura indígena. Há uma sabedoria, apreendida em séculos de convívio harmônico com a natureza, que engloba um conjunto valioso de saberes, que muito pode contribuir na busca de caminhos a serem trilhados pela humanidade, em todos os tempos.

Quando o indivíduo é bem resolvido em sua própria identidade, ele é capaz de se confrontar com outras identidades sem grandes problemas. Se a diversidade não for vista e sentida de maneira positiva, ela não poderá ser compartilhada em suas riquezas e, consequentemente, restará apenas o fechamento de cada povo em si mesmo e em seu próprio egoísmo e em seu próprio egocentrismo. A humanidade se distanciará de seu mais fundamental desenvolvimento.

Postado por José Morelli

 


quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

"Bem-estar"

 Estar e perceber-se bem. Sentir-se confortável, sem incômodos que impeçam a própria vida de ser reconhecida como estando satisfeita em seus desejos. Fazer o que deve ser feito de maneira fluida, prazerosa. Dar-se o descanso sem se fazer cobranças de não parar de produzir nenhum instante. Dormir um sono leve e reconfortante. Permitir-se sonhar sonhos bons e agradáveis. Levantar de manhã cedo, podendo sentir o frescor do dia que nasce. Estes e outros “bem-estares” merecem ser desejáveis? Constituem-se como um direito legítimo e mesmo necessário à vida de qualquer pessoa ou seriam eles um privilégio concedido apenas a alguns poucos eleitos da sorte?

A resposta a estas perguntas se encontra na própria natureza humana que, por sua contingência material, embora represente oportunidade, não deixa de impor limites a suas possibilidades. A matéria, constituindo-se também como tempo e espaço, é a base sobre a qual se sustenta qualquer realização humana. Na maior parte das pessoas, felizmente, parece existir certo equilíbrio entre as situações que geram sensações de bem-estar e mal-estar. Em outras, em número menor, se observa o predomínio de situações e de sensações de bem-estar. Por fim, há um terceiro grupo de pessoas não tão numeroso, em que predominam sensações incômodas de mal-estar.

É voz comum que, por sua utilização, o cachimbo deixa torta a boca de quem dele faz uso constante. Assim também o predomínio de situações e de sensações de mal-estar tende a tornar crônica essa sensação.  O mesmo se pode dizer a respeito daqueles em que predominam sensações positivas de bem-estar, sensações estas que podem levar a dificuldades de aceitação da realidade em seus aspectos mais difíceis de serem enfrentados.

Seja qual for a qualificação das situações e das sensações, prazerosa ou dolorosa, importa sobremaneira que cada um aprenda a lidar com as próprias percepções temperando-as com objetividade em seus juízos e compreensões. Os juízos que delas são feitos pela mente de cada indivíduo podem ou não ajudar na forma de administrá-las. A capacidade emocional de suportá-las se desenvolve na medida em que são feitas constatações, que ajudam no dimensionamento mais aprofundado da realidade em seu todo.

Postado por José Morelli

 

  

 

 

domingo, 3 de janeiro de 2021

Casa & Terreno

Inúmeros são os testemunhos de que a casa, situada no número 80 da Rua Dr. João Ribeiro, esquina com Major Ângelo Zanchi, foi a primeira no histórico bairro da Penha de França construída em alvenaria. Nela morou Dona Catarina de Albuquerque. Sua localização ocupa o chamado Centro Histórico da Penha. Anos atrás, em uma entrevista dada a este jornal, Dona Catarina, já com idade muito avançada, testemunhou ter participado de uma recepção ao Imperador Dom Pedro II, juntamente com sua esposa, a Imperatriz Teresa Cristina, tendo, ela e outras meninas, jogado pétalas de rosas sobre o casal, no interior da Igreja de Nossa Senhora da Penha.

No quintal desta mesma casa havia uma nascente de água potável. Em um passado não tão recente, algumas pessoas fizeram um teste para verificar se a água que por ali passava e passa era a mesma que também jorra no Clube Esportivo da Penha. Jogaram um corante dentro do poço e foram ver se a água colorida chegaria àquela nascente. A experiência não comprovou a hipótese presumida.

Hoje, as condições de preservação do imóvel se encontram precaríssimas. O quintal, embora tenha sido todo recoberto com um piso de cimento, nem para estacionamento vem sendo utilizado.

Nos folhetos promocionais que divulgam vendas de apartamentos em prédios, na Penha, é comum encontrar o apelo da historicidade do bairro. É um glamour a mais a tradição de tantos anos com tantos acontecimentos relevantes, garantia de que a vida aqui vai continuar sendo tão generosa aos seus futuros moradores como o foi para as gerações passadas.

A fim de que não se fique apenas no discurso, vale propor que sejam feitas ações concretas no sentido de recuperar esses e outros bens históricos que ainda restam no bairro. A retirada do piso e o replantio do verde no quintal acima referido, faria com que a nascente voltasse a prover as pessoas com seu precioso líquido, um exemplo eloquente de cuidado pela natureza e de amor às futuras gerações.

Postado por José Morelli