segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Quadro clínico

 Temos a noção do que é um “quadro”. Nossa imaginação logo o constrói, toda vez que ouvimos falar, em nossa língua, a palavra que o representa. É da natureza do quadro, mostrar-se. A expressão “quadro clínico”, portanto, é apropriada para dizer de como se encontra, num dado momento, o doente. A palavra “clínico”, que tem origem grega, significa: inclinado/ deitado, alguém que não está bem de saúde e necessita de uma atenção médica especial.

Os quadros convencionais não se movimentam. Apresentam-se estáticos, parados. Aquilo que é, por eles, mostrado hoje, continuará a sê-lo amanhã, no próximo mês, daqui a um ano. Já o quadro clínico de um doente evolui: é dinâmico, vivo, movimenta-se podendo progredir ou regredir, melhorar ou piorar. Neste ponto, a comparação com o quadro não é perfeita. As imagens em movimento, que hoje existem em grande quantidade, poderiam expressar melhor esta particularidade dos quadros clínicos.

Uma foto. O quadro clínico é como uma foto. Para poder acompanhar a evolução do estado do doente, é preciso fotografa-lo de tempo em tempo. Pela comparação das primeiras imagens com as mais recentes, é possível medir a direção e a rapidez com que a doença se retrai ou evolui. Não é possível acompanhar tudo. Procura-se, então, observar os aspectos mais relevantes e representativos em cada caso.

Na psicologia, quantificar é mais complicado. A vida mental e emocional possui maneiras e maneiras de se manifestar. Os testes são bons instrumentos de medição. Com eles, podemos alertar-nos sobre aspectos básicos de um problema. É preciso ter muita abertura na hora de interpretar os resultados. Nada é absoluto. A mente e os sentimentos podem ser extremamente velozes em suas mudanças. A lógica do ser ou não ser nem sempre se aplica. Na subjetividade de cada indivíduo as contradições, que podem ser comparadas a nós, nunca deixam de estar presentes.

Nós, desses difíceis de serem desmanchados, nunca faltam em qualquer quadro clínico de problemas psicológicos. Identificá-los é uma tarefa que exige esforço e coragem. Quanto a desatá-los, é um desafio para a vontade firme de quem deseja libertar-se. O estímulo é saber que libertar-se é renascer, é passar de um estágio da vida para outro, é perder para poder ganhar algo novo, um processo que nunca é desacompanhado de algumas dores. Dores que servem como fertilizantes para a produção de novas alegrias de viver com mais qualidade.

Postado por \José Morelli

sábado, 14 de outubro de 2023

Paralelismos

 Para facilitar a identificação das localizações, no globo terrestre, este é subdividido por linhas imaginárias, no sentido horizontal e vertical. No primeiro destes sentidos, estão a linha do Equador, que divide o globo ao meio, separando os dois hemisférios: Norte e Sul, bem como os trópicos ou paralelos: de Câncer e de Capricórnio, o primeiro acima da linha do Equador e o segundo abaixo da mesma. No sentido vertical estão os chamados meridianos. De acordo com as posições dos trópicos, são identificadas, em seus respectivos períodos, as quatro estações do ano, em cada lugar. Já os meridianos identificam as horas do dia e da noite, a cada volta que a Terra dá, ao redor de si mesma.

Na medida em que os lugares estão mais ou menos próximos das regiões polares, o frio é mais ou menos intenso. Na medida em que os lugares estão mais ou menos próximos da linha do Equador, o calor também se torna mais ou menos intenso. As estações se manifestam de maneiras diferentes, dependendo da localização em que se encontra cada região. No Canadá, a passagem do inverno para a primavera, muda a paisagem radicalmente, o branco das geleiras dá lugar ao verde das folhas e ao colorido das flores. No Brasil, essas transformações ocorrem de maneira menos drástica, uma vez que as temperaturas, aqui, oscilam em graus mais amenos, nem tão frios nem tão quentes.

Ruas paralelas são ruas que, justapostas, seguem numa mesma direção. Fazer um paralelo ou paralelismo é o mesmo que fazer uma comparação. Os fatos que acontecem no mundo em níveis amplos, tendem a acontecer, em outros níveis, de maneira mais ou menos semelhante. O que acontece nos relacionamentos entre os hemisférios, tende a acontecer nas relações intercontinentais, entre países de um mesmo continente, entre estados de um mesmo país, entre bairros de um mesmo município, entre ruas de um mesmo bairro, entre famílias de uma mesma rua, entre pessoas de uma mesma família, entre partes do corpo de uma mesma pessoa.

Os ataques terroristas nos Estados Unidos e a guerra que vem acontecendo no Afeganistão provocam paralelismos em todos os níveis. Espécies de ressonâncias, semelhantes às provocadas pelas ondas sonoras e que nos atingem sensivelmente, em nossas mentes e em nossos corpos. Em certo sentido, não deixamos de ser solidários peas alegrias e pelas tristezas que o mundo vive em sua história.

Postado por José Morelli

Paralelismos entre natureza e tempo

                                       Desde o instante em que fomos gerados no seio materno,

passamos a conviver com a natureza maior que a nós era pré-existente.

Fomos contemplados como pedras do bingo, que completa uma cinqüina.

O tempo se desenrola como um novelo e nos introduz na sucessão de dias e de noites,

Constituindo-nos como passado e presente.

A temporalidade nos estimula e assusta ao mesmo tempo.

Natureza é palavra de gênero feminino.

Tempo á palavra de gênero masculino.

Para transformar-se e gerar novas formas de vida, a natureza precisa do concurso do tempo.

 

Pela maternidade, a mulher experimenta-se como mãe e como filha, (mais uma vez).

Percebe-se investida com um poder que antes só via em sua mãe.

A natureza é mãe permanentemente.

Tempo é sempre fugaz e passageiro, escapando-se pelos vãos dos dedos.

Uma flecha lançada ao ar que ninguém consegue detê-la em seu curso.

O tempo é pai, movimento, energia.

Sem ele, a natureza permanece inerte, não tendo como se modificar

 Natureza e tempo caminham para o imprevisível.

Compartilham entre si ansiedades e angústias.

Homem e mulher compartilham a sabedoria da transitoriedade, da temporalidade, da finitude e da infinitude.

Aprende a usufruir da vida enquanto ela acontece

A vida vai e se esvai inexoravelmente.

A consciência humana busca sentido para tudo com que a vida se defronta.

Conforta-se com a sensação de permanência e de descanso,

Um lago tranqüilo margeado por relva verdejante.

 

Homem e mulher – pai e mãe – natureza e tempo.

Poder e submissão

(poder submisso e submissão poderosa: alternâncias de ilusões)

 Natureza e tempo na sucessão: filhos e filhas

A arte de transmitir e de fomentar a vida.

Pai e mãe unidos pelos mesmos objetivos.

O cultivo da sensibilidade para consigo e para com o outro.

A superação do egoísmo.

O legado de cada dois... a posteridade.

A semente remanescente do fruto...

Semente natureza, que se transforma e dá origem a novas vidas.

O jogo do poder nas identificações e nas diferenciações. 

Postado por José Morelli

 

Para além das controvérsias

 Existe um chão batido sobre o qual as pessoas não podem deixar de caminhar, sob pena de perderem o que julgam indispensável ao próprio viver e ao viver das gerações futuras. O instinto de sobrevivência é uma dessas energias que funcionam automática e imperiosamente, a partir de dentro para fora de cada indivíduo. Dizem que o cavalo, com toda a sua destreza e pose, não consegue passar em uma pinguela e que o burrinho, sempre tão menosprezado em sua capacidade, quando instigado a transpor alguma, simplesmente fecha os olhos e vai de um lado para o outro, não se atendo a possíveis controvérsias.

Considerando a sociedade em seu todo, nota-se que as pessoas não são iguais em suas maneiras de ser e de agir. As respostas de cada uma às demandas naturais são formuladas das mais variadas maneiras. Uns apostam na capacidade crítica dos cidadãos, enquanto que outros consideram que o desenvolvimento do conhecimento e da crítica é perigoso para uma boa organização econômico-social, principalmente.

Viver e conviver são dois importantes imperativos: duas grandes sabedorias humanas. Desde pequeninas, as crianças se voltam para onde se encontram o amparo e o alimento. Essa mesma lei também acompanha a trajetória de vida das pessoas adultas, da maturidade à velhice.

Alguns acham que são as elites que dão as cartas para o jogo da vida e que as massas são apenas usadas como meios de manobras. Sabe-se também que as elites se digladiam entre si no sentido de exercer domínio sobre as massas. Os discursos utilizados apresentam os mais diferentes argumentos.

A humanidade já passou por muitas experiências históricas. A sabedoria armazenada não se perde totalmente. Fica guardada no subconsciente coletivo das diversas culturas existentes. Cada geração deixa as marcas de suas descobertas. A geração atual também está deixando suas marcas. As consequências das escolhas feitas já podem ser percebidas a partir dos resultados que estão sendo produzidos. Os rumos precisam ser sempre reavaliados. Não há o que estranhar, uma vez que se trata de uma tarefa que precisa ser realizada com muita garra e sem interrupção, deixando de lado quaisquer controvérsias.

Postado por José Morelli

sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Generalizar

 Generalizar é uma tendência mais ou menos frequente, que pode ser fruto de uma preguiça mental, de um comodismo ou “lei do menor esforço”, às vezes, até mesmo de uma maldade menos consciente. É comum ouvir-se afirmações baseadas em generalizações. Cada pessoa tem sua identidade própria, não merecendo atribuições, só pelo fato de ser desta ou daquela região do país ou por ser desta ou daquela cor ou raça.

Acontece, também, de pessoas que apresentam algum defeito físico serem vistas e tratadas de forma a terem generalizadas essa sua condição de deficiência. Tratam-nas como se sua incapacidade fosse generalizada, vendo-as com mais deficiências do que efetivamente possuem. A cegueira do cego o impede apenas de ver e não de manter-se de pé. É por isso que, algumas vezes, o cego, educadamente, agradece a pessoa que lhe cede o lugar para assentar-se no ônibus. Na verdade, o cego é só cego e não aleijado.

Generalizar é uma maneira simplista de ler e interpretar a realidade. Baseando-se em apenas um ou em alguns motivos, tira-se a conclusão sobre o todo, reduzindo-o e empobrecendo-o em sua compreensão e entendimento.

O filme “Um Estranho no Ninho”, do diretor Milos Forman, mostra bem as consequências desse entendimento limitado, no tratamento dos doentes mentais, confinados em manicômios.

Tratando o doente mental, reduzido no seu entendimento a um único aspecto de sua realidade e desconhecendo sua condição humana plena, como pessoa que é, dotada de capacidades e múltiplas necessidades, o filme mostra os equivocos de certos tratamentos em ambientes fechados e restritos.

Generalizando as condições dos doentes, “Um Estranho no Ninho” mostra a prática de uma rotina que nivela a todos, não reconhecendo as necessidades individuais. Em nome do bem comum, são praticadas pequenas e grandes violências, talvez um retrato ampliado de situações com as quais convivemos muito frequentemente em nossos dia-a-dia “normais”.

Postado por José Morelli