quinta-feira, 7 de março de 2024

"Pagar a língua"

Nosso idioma português possui inúmeras expressões de linguagem, capazes de traduzir as idéias mais sutis e interessantes. Pagar a língua é uma dessas expressões, cujo verbo é utilizado não em seu sentido literal, mas simbólico. Não se trata de pagamento em que o dinheiro serve à transação. Pagar, neste caso, significa: “dever se arrepender ou voltar atrás do que disse”; “ter que arcar com as conseqüências do que falou”.

A palavra, tendo saído da boca, volta-se contra aquele mesmo que a pronunciou. Um caminho de ida e de volta. A verdade pronunciada retorna. O incentivo dado gratifica a quem o dá. O veneno da língua ferina não recomenda que a mesma seja mordida. O que vale para a palavra, vale também para os pensamentos, mesmo para aqueles não manifestados exteriormente, porém contidos no interior da mente e, por fim, para as ações, estas sim expressas em gestos concretos e perceptíveis a olhos humanos ou a atentas câmeras de segurança.

O preço a ser pago é estabelecido pela consciência de quem diz, pensa ou faz. Uns possuem consciência mais exigente, cobram mais de si mesmos; enquanto que outros possuem consciência mais relaxada, pouco ligando para o que têm ou não a pagar quando falam qualquer besteira. Os primeiros parecem sofrer mais do que os segundos. Pela insensibilidade que estes demonstram, muitas vezes conseguem transferir para outros os sofrimentos que deveriam sentir na própria pele. Quanto marido sente pelo que fala a mulher e quanta mulher sente pelo que fala o marido, principalmente quando este já bebeu umas e outras, a mais do que devia?!

O preço a ser pago pode também ser estabelecido por aquele que se sentiu ofendido pela palavra que o outro descuidadamente vomitou de sua boca. A reação é imediata: Você vai engolir tudo o que está falando, palavra por palavra! Aí, é que a coisa fica feia mesmo. Os ouvidos que ouvem, os olhos que vêem não deixam barato e reclamam por justiça. O direito de cada um chega até o ponto em que começa o direito do outro.

Os direitos são individuais e coletivos. Os direitos de cada grupo chegam até o ponto em que começam os direitos de outro grupo. Um não é superior a outro. Nas relações, até mesmo nas internacionais, as atitudes tomadas não ficam sem um preço a ser pago. A partir dos exemplos que são dados por indivíduos e por instituições, as crianças vão tirando suas conclusões, a fim de construirem o próprio senso de justiça. Depois de tudo, não haverá como chorar pelo leite derramado. O momento presente é crucial. A boca fala aquilo que o coração carrega em si, abundantemente. Você não acha também que Pagar a língua merece ser considerada uma feliz expressão de nossa língua pátria?!

Postado por José Morelli

  

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário