sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Encontro de gerações

Naquela foto, tirada em 1.911, estavam retratados: o casal, acompanhados de suas primeiras quatro filhas, nascidas até aquela data. Sabe-se que, depois, vieram ainda mais sete filhos homens e mais duas mulheres. O primeiro dos homens já se encontrava em gestação. No retrato, em branco e preto, adultos e crianças vestem-se com discrição e elegância, de acordo com o costume da época.

Maria Cruvinel é o nome da menininha, que se encontra de pé com a mãozinha apoiada no joelho da mãe. Hoje, ela está com 95 anos (quando da feitura deste texto). Sua cabeça está ótima, podendo contar histórias que ouviu ainda em sua infância sobre seus pais e seus avós. As feições dela, na foto, se assemelham a de uma de suas bisnetas que, no momento, se distrai jogando baralho com sua irmã mais velha. Na sala, além das visitas, se encontram ainda a filha e a neta de dona Maria, respectivamente, avó e mãe das meninas que se distraem brincando.

Dona Maria é incentivada pelas visitas a relatar algumas de suas histórias. Mesmo com o pouco volume de sua voz, todos os que se encontram na sala conseguem escutá-la. Conta de sua avó, falando de sua coragem e de como enfrentava os problemas daqueles tempos difíceis... quando seu marido trabalhava em garimpos no estado de Goiás, quando os índios invadiam as terras onde moravam, tendo que irem se refugiar numa fazenda, cujo proprietário e outros que tentaram morar nela diziam ser a casa assombrada, quando, anos depois, vieram morar em São Sebastião do Paraíso, tendo ficado viúva e enfrentado muitas dificuldades.

Relatou que, antes de irem para a fazenda em Goiás, seu avô perguntou à sua avó se ela não tinha medo de ir morar numa casa que diziam ser assombrada, ela respondeu: “não tenho medo de nada, por que para me defender de meus inimigos invisíveis, tenho minhas boas orações e, para me defender de meus inimigos visíveis, tenho minha arma de fogo” (uma velha espingarda). Contou como ela desvendou o segredo do que todos diziam ser assombração. Tratava-se de um negro fugitivo que vinha buscar alimento dentro da casa. Sem que chegasse a conhecê-lo, alimentou-o durante 15 anos. Quando ele deixou de vir, sentiu-se liberada para mudar-se para outro lugar onde os filhos, já em idade escolar, pudessem estudar. Histórias de índios e de escravos fugitivos fazem com que se possa voltar para outros tempos, com características muito diferentes das de hoje. As bisnetas também ouvem e guardam as lembranças dessas histórias, projetando-as para o futuro. Talvez, um dia, poderão contá-las para seus filhos, netos e até bisnetos, estabelecendo sempre novos reencontros, geração a geração.     

Postado por José Morelli

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