domingo, 7 de novembro de 2010

"Quebrar arestas"

A sabedoria popular criou o provérbio: “água mole em pedra dura tanto bate até que fura”. As corredeiras dos rios fazem com que lascas de pedras se desprendam, carregando-as consigo. Na medida em que estas se chocam umas com as outras e com os obstáculos encontrados nas margens e nos leitos profundos ou rasos dos rios, vão pouco a pouco quebrando suas arestas, arredondando-se em suas formas. Antes de as quebrarem, essas pedras são levadas pela correnteza com mais dificuldade e lentidão, por causa do maior atrito provocado por suas superfícies irregulares e pontiagudas. O arredondamento faz com que as mesmas ganhem mais leveza e velocidade. Estas são as contrapartidas pela perda das arestas.

A expressão “  quebrar arestas” também se aplica aos relacionamentos interpessoais. A vida humana pode ser comparada a um rio que leva. Quanto mais intenso é o relacionamento entre duas pessoas, maiores são as oportunidades destas se colidirem e de se quebrarem em suas próprias arestas, consideradas como defesas indevidas ou desnecessárias. A amizade, o namoro, o casamento, o relacionamento entre pais e filhos, entre irmãos, entre professores e alunos, entre colegas de escola ou trabalho, todos os relacionamentos inevitavelmente provocam tensões (atritos). Superfícies que se apresentem com maior dureza, podem resistir mais às colisões e permanecerem por mais tempo sem sofrerem alterações em suas formas. Deste modo, não se arredondam e continuam a atritar com as outras superfícies com a mesma morosidade. Com isso, não conseguem fluir como as outras, com a mesma leveza e rapidez.

As arestas não permitem muitas aproximações entre as pedras. Ao se chocarem, elas imediatamente se afastam umas das outras. São como espinhos que ferem e impedem de se encontrarem em suas partes mais essenciais. Homens e mulheres possuem arestas. Diferenças e semelhanças podem ser entendidas como ameaças à integridade física e moral por ambos. Dependendo de como essas diferenças são passadas de um para o outro, a compreensão das mesmas pode receber conotação construtiva ou destrutiva, transformando-se em arestas.

O rio e a vida levam. As pedras são carregadas juntamente com as águas rumo ao mar. Na aventura de se viver humanamente, quem sabe perder, permitindo-se quebrar nas próprias arestas, não perde verdadeiramente. Consegue entender que, perdendo aprimora-se, o que implica em ganhos maiores, como: maior intimidade e profundidade com os pares, maior leveza e rapidez para chegar ao objetivo.

José Morelli

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