As palavras buscam expressar
aquilo que as idéias conseguem entender dos fatos. Falar de encantos e desencantos pode trazer à
lembrança a imagem de um mago com enorme turbante à cabeça, tocando sua flauta
diante do cesto, do qual uma serpente com língua trêmula vai subindo lentamente.
Esta parece não resistir à magia da música. A força do encantamento faz com que
a víbora deixe de lado sua comodidade e se volte, como que enfeitiçada, para algo
fora de si, sem atinar para o risco a que se expõe.
Encantos são objetos de nossos
desejos. Eles têm o poder de nos atrair. Ficamos infelizes e inquietos enquanto
não conseguimos que se concretizem. A imagem que trazemos de nós mesmos, em
nossa mente, se completa quando os conquistamos. Sentimo-nos mais realizados e
valorizados, com o nosso ego narcisista inflado, tanto perante aos nossos
próprios olhos como também perante aos olhos dos outros.
As pessoas
possuem a capacidade de se encantarem e de se desencantarem umas às outras. Os
mútuos conhecimentos se dão, geralmente, a partir da forma física, da aparência
externa. O que salta aos olhos em primeiro lugar é o invólucro, só depois é que
vem à tona o conteúdo interno: a personalidade, com suas qualidades e defeitos.
Os momentos difíceis, vivenciados no companheirismo e na solidariedade, são
aqueles que conseguem provar melhor o quanto de cumplicidade duas pessoas são
capazes de manterem entre si. Existem pessoas que só conseguem se encantar
enquanto se mantém voltadas para a parte física do outro. Perdem o
encantamento, quando se deparam com sua realidade mais profunda.
“Não sou tudo isso que você está
vendo em mim... são os seus olhos que me vêem assim!” Os encantamentos podem
existir naquele que traz, em si, o desejo pelo outro ou nesse outro, que corresponde
como objeto desejado.
Quem idealiza muito alto e espera
demais de si mesmo e do outro, corre o risco de se desencantar com a realidade
humana, inerente a todo ser mortal. Tal pessoa pode, rapidamente, passar do
encantamento para o desencantamento. Enquanto busca apenas a si mesma no outro,
não consegue encontrar nem a si própria, nem a mais ninguém. Perde a
oportunidade de se lançar na aventura de acreditar em sua própria capacidade de
amar e de acreditar que é amada por outra pessoa.
Por José Morelli
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